Alimentos industrializados para crianças: será que tem “tudo o que seu filho precisa”?

Descubra os riscos dos alimentos industrializados para crianças e como fazer escolhas mais saudáveis para o seu filho.

A indignação que me levou a escrever este texto é uma constante na minha prática. Se as recomendações atuais dizem para não oferecer açúcar a crianças menores de 2 anos, por que ainda encontramos nos supermercados alimentos industrializados para crianças muito conhecidos, à base de cereais, indicados a partir de 6 meses, cujo segundo ingrediente é açúcar?

Isso significa que ele é o segundo principal componente do produto, ficando atrás apenas da farinha de trigo. E, para piorar, os rótulos ainda exibem apelos comerciais como: “marca parceira das famílias na jornada de alimentação complementar, oferecendo soluções à base de cereais com nutrientes para diferentes momentos do seu bebê. Nós revelamos o poder do alimento para melhorar a qualidade de vida de todos hoje e para próximas gerações”.

Entendo que, com a correria do dia a dia, muitas vezes não conseguimos acompanhar todas as recomendações e acabamos tomando decisões rápidas, nem sempre ideais. Por isso, é fundamental termos esse tipo de conversa, para juntos entendermos o que realmente faz diferença na alimentação dos nossos filhos e como podemos simplificar o caminho para escolhas mais saudáveis e nutritivas.

Alimentos industrializados para crianças: O que dizem as recomendações oficiais?

Como escolher industrializados saudáveis para crianças em 3 passos

Em 2005, o Ministério da Saúde e a Organização Pan-Americana da Saúde lançaram um Guia Alimentar que recomendava a introdução do açúcar na dieta das crianças apenas a partir de 1 ano. Esse guia já reforçava a importância de estimular o consumo de frutas, verduras e legumes desde o início da alimentação sólida, reconhecendo esses alimentos como importantes fontes de vitaminas, cálcio, ferro e fibras. No entanto, mesmo antes disso, em 1999, um estudo brasileiro já mostrava o baixo consumo desses alimentos e o alto consumo de açúcares e cereais entre crianças de 6 a 24 meses.

Hoje, a situação não mudou muito. Entre 2019 e 2020, foi realizado o ENANI-2019 (Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil), o primeiro estudo brasileiro de base populacional com representatividade nacional, que avaliou a alimentação e nutrição de crianças menores de 5 anos. O estudo revelou que o consumo de alimentos in natura, como frutas, legumes e verduras, ainda é baixo entre as crianças, enquanto o consumo de alimentos industrializados para crianças e bebidas adoçadas continua alto. Isso demonstra que, apesar do conhecimento disponível, muitos pais ainda têm dificuldades em aplicar essas recomendações no cotidiano.

Mais recentemente, o Guia Alimentar para Crianças Menores de 2 Anos (2019), do Ministério da Saúde, reforçou que alimentos industrializados para crianças contendo açúcar e ultraprocessados não devem ser oferecidos antes dos 2 anos de idade. Organizações internacionais, como a Academia Americana de Pediatria e a American Heart Association, também recomendam limitar o consumo de açúcar a no máximo 25 gramas diárias entre 2 e 18 anos e evitar completamente em crianças menores de 2 anos.

Em 2023, a Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou novas orientações sobre introdução alimentar, enfatizando a necessidade de evitar alimentos ricos em açúcar, sal e gordura trans para bebês de 6 a 24 meses.

Por que os alimentos industrializados para crianças ainda têm açúcar?

Mesmo com todas essas recomendações, alimentos industrializados para crianças com açúcar ainda são amplamente comercializados. Isso ocorre por diversos fatores:

  • Legislação e Regulação: As leis sobre alimentos infantis podem ser permissivas quanto ao uso de açúcar ou marketing desses produtos.
  • Marketing e Demanda do Consumidor: Empresas de alimentos investem pesado em marketing, criando a percepção de que seus produtos são benéficos. Muitas famílias, sem acesso a todas as informações, podem confiar cegamente nesses rótulos.
  • Lacunas na Comunicação: As orientações das organizações de saúde podem demorar a se refletir globalmente. Isso cria uma brecha para a indústria continuar promovendo alimentos com açúcar.
  • Interesses Comerciais: O açúcar melhora o sabor dos produtos, tornando-os mais atraentes para as crianças e lucrativos para a indústria alimentícia.
  • Interpretação Flexível das Diretrizes: Algumas empresas argumentam que pequenas quantidades de açúcar em seus produtos não causam mal, criando uma falsa sensação de segurança nos pais.

Ao andar pelo supermercado, é fácil ficar confuso com as promessas de saúde que vemos nas embalagens dos alimentos industrializados para crianças. O cansaço e a rotina muitas vezes nos levam a buscar soluções rápidas, mas é fundamental estarmos atentos a esses detalhes para garantir que estamos realmente nutrindo nossas crianças da melhor maneira.

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Quais são os riscos da introdução precoce de açúcar?

O consumo precoce de açúcar pode aumentar a chance de ganho de peso excessivo durante a infância, contribuir para o desenvolvimento de obesidade e outras doenças na fase adulta, e provocar placa bacteriana nos dentes e cáries — sim, inclusive nos dentes de leite. Naturalmente, a criança já tem preferência por sabores doces desde o nascimento. Se acostumada com alimentos açucarados, ela poderá ter ainda mais dificuldade para aceitar verduras, legumes e outros alimentos saudáveis.

Não ofertar açúcar e produtos industrializados que o contenham nos primeiros 2 anos de vida contribui para a formação de hábitos alimentares mais saudáveis. Além disso, o desenvolvimento cerebral de crianças pequenas não está preparado para receber essa carga extra de estímulo antes dos 2 anos, o que pode afetar negativamente seu crescimento cognitivo.

O que está mudando?

Em 2024, uma Consulta Pública foi aberta para discutir diretrizes sobre suplementos alimentares e produtos nutricionais, como fórmulas infantis e alimentos à base de cereais. Embora ainda não tenhamos resultados oficiais, o processo está em andamento e pode influenciar a rotulagem e a comercialização desses alimentos no Brasil.

Além disso, o Enani 2024 também está em andamento e trará dados atualizados sobre a alimentação infantil no Brasil.

Seu filho realmente precisa de alimentos industrializados?

Diante de tantos alimentos industrializados para crianças, é essencial refletir: será que seu filho realmente precisa deles? Crianças precisam de comida de verdade, e é urgente que as famílias priorizem essa necessidade. A conscientização e a educação contínua sobre as melhores práticas alimentares são fundamentais para superar os desafios impostos pelo ritmo acelerado da vida moderna e pela indústria alimentícia.

Se você busca orientação para alimentar melhor seu filho, procure sempre informações de qualidade e considere o acompanhamento nutricional. Junto com profissionais engajados na promoção de saúde e prevenção de doenças, é possível construir hábitos alimentares mais saudáveis para as próximas gerações.

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Giselle Gattai | Nutricionista

Sou Nutricionista com Especialização em Nutrição Clínica em Pediatria pelo Instituto da Criança - HCFMUSP. Me tornar mãe de duas meninas me transformou e hoje meu propósito é ajudar famílias a melhorarem a forma de se alimentar e a forma de conduzir a alimentação das crianças, contribuindo para a prevenção de doenças relacionadas à má alimentação. Acredito na Nutrição desde o início da vida, Nutrição que vai além dos alimentos que comemos, inclui a forma como comemos, onde nos alimentamos, com quem... Enfim, esse universo que envolve o comportamento alimentar.

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